sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Se pudesse escrever na velocidade do meu desejo esta frase estaria incompleta.

Carta ao meu amado desconhecido

Preciso te dizer uma coisa hoje, quando ainda não te conheço. E digo logo tudo, para que não duvides de mim mais tarde.

É difícil te esperar mas estou feliz. Não sei onde vamos nos encontrar nem quando e estou ansiosa por isso, para que você mude a minha vida e me faça amar de novo.

A cigana insiste em te descrever: sei que és alto, branco e de cabelos negros. E que vou viajar para longe e é nessa viagem que vamos nos conhecer. Conversaremos e logo de início ficarás encantado comigo. Nos casaremos e teremos filhos. Uau, que destino o seu, se apaixonar por mim, uma mulher tão confusa , tão frágil e ainda tão insegura porque sigo só nessa vida. Depois que nos encontrarmos quero mudar, ter mais certeza de mim já que você chegou.

Sou moderna porque não gosto dos homens que me amam. Com você quero ser Beethoven.
É lindo te amar hoje, hoje que não faço a menor idéia de quem és ou de onde andas. Estremeço quando penso no nosso encontro. Será que irei te reconhecer assim, logo de cara? Espero que não, não conseguiria falar. E ficaríamos apenas rindo os dois, você passaria a mão direita, grande a forte, nos meus cabelos e eu abaixaria a cabeça, um pouco envergonhada. Depois de um breve silêncio, coberto por uma troca de olhares curiosos, eu finalmente te diria: como você demorou. E talvez começasse a chorar, como quero chorar agora que me sinto tão só e injustiçada por saber que sofro tanto e que você está num lugar que não sei, num país que não sei, num tempo que não sei.

Te procuro em todos, em qualquer um, pra que eu vá me distraindo até pegar esse avião pra essa tal viagem “longe” e finalmente ache o meu obscuro objeto de desejo.

Mas antes devo virar escritora, diz ela. Heim? Sou atriz, produtora, escrevo apenas porque gosto, nunca ganhei uma moeda sequer com meus escritos.

Me dói o coração por saber que o caminho será longo e choro novamente. Mas que delícia é pensar em você e imaginar o seu rosto. O mais lindo de todo o mundo que é a sua imagem em mim. A imagem do meu amor determinado pela bela cigana que insiste em me falar: tenha calma, ele vai chegar...

Aí me vem a mente aquela velha discussão entre o acaso e o destino. O que é isso, essa pré determinação da minha vida? Sinto um pouco de medo, admito.

Te amo, te amo, te amo e no momento quer dizer te amo em mim, te amo em mim e me amo na parte que sou você. Chega logo, pula esse tempo, essa distância, larga essa mulher, esse trabalho, essa moléstia, essa preguiça ou ansiedade e me busca aqui no meu quarto agora. Ta bem, estou aprendendo a esperar. Pode ser amanhã então, é bom que dá tempo deu arrumar as malas todas e comprar algumas coisas para que possamos partir com mais conforto. Partir pra onde? Pra realização do nosso destino, do arcano maior de número seis, vamos logo resolver isso tudo. Minha mocidade está indo embora e daqui a pouco não serei mais bela. Quando me arrumo penso que me arrumo para você e é um simples detalhe se você não está aqui para compartilhar de tudo de belo que tenho (a agora choro de fato). Mas que viagem é essa? Que tempo é esse que me impede de entregar essa carta para o seu destinatário?

sábado, 26 de junho de 2010

Sempre em três - regra três?

Pois sempre me sinto perdida. Mesmo quando estou em casa, sem luz, me sinto assim um pouco zonza, com uma vontade lá no fundo de chorar. É a falta de graça das coisas, que começam sempre bem mas caem na insistente forma de pensar: viva a monotonia.

Tenho sentido um medo terrível do mundo acabar e eu ter ficado em casa, sem ter provado toda a maravilhosa tecnologia japonesa e todos os benefícios da era moderna. Meu sujeito me adorna dialeticamente entre a vaidade e a desconsideração.

Devo perdoar a todos mas não consigo perdoar o meu pai. Estou acostumada a fazer todas as coisas no escuro porém a dor do seu abandono voluntário me jogou na cara o quanto sou despresível. A troca é a vida.

Um casal de cachorros só se ama quando ela está no cio. Aí eles dormem juntos, andam pelos matos e brincam descompromissadamente. Passada essa fase ele volta à rotina de ir para a garagem procurar melhores oportunidades. E ela espera o próximo cio.

Devemos fazer cenas, sempre. Só assim chamamos atenção. Grunhir sem razão deve ser a máxima da existência. Dar voltinhas ao redor da comida e choramingar por um olhar qualquer. Depois se cansar e mudar de ambiente.

Minha menstruação agora é como uma doença já esperada. A barriga dói a cada primeiro dia do ciclo. O pior é quando me dói a psique. Grito por dentro e mordo minha raiva dessa merda de vida.

Todas as placas informativas, descritivas, educativas ou obrigatórias no Brasil são relativas. Só valem de acordo com a vontade de quem as lê – ou de quem as coloca. Um PARE pode virar um foda-se facilmente.

O candomblé é o rito do poder do mistério. Onde se pode ir, como se pode ir, o que se pode comer ou o que está por debaixo de cada balaio faz-se a relação entre os adeptos. Quanto mais panos mais feitiço. É como uma dançarina do ventre. Véu e revelação.

1,2,3,
2,1,3,
3,1,2,

Bonitinha a matemática!

Me acusam de delirante. Busco afetos impossíveis, não dialogo com o local, logo, não quero o possível. Cruel coração desejante, que almeja o infinito e acaba na triste empiria de simplesmente ser cotidiano.

Se penso que tenho mesmo que amar o meu vizinho logo reflito: será o meu vizinho tão diferente de mim que irei deseja-lo ou terei um tédio imenso ao imaginar que a única coisa que irei encontrar será o meu espelho?
Ando tão perdida que nem tarô, nem jogo de búzios e nem conversas com Exu tem dado jeito. Não sei mesmo o que fazer, abandono o que construí ou me resigno ao destino que insiste em me tirar o sono e me acordar com a lembrança do desejo.

Encontrar velhos amigos é como acelerar o carro. Sei bem como fazer, sei até virar o volante, acredito na tecnologia mas o tempo, ou meu ou o do carro, me faz sentir que a pista, apesar de comum, pode ter um novo buraco daqui a pouco mesmo.

Queria ser muito mais feiticeira do que sonho. Manipular as energias do universo é uma espécie de transa narcísica, falamos com o todo através daquilo que mais queremos. Quero tudo e nada mais me importa.

Amo o álcool. Sua força em me colocar meio estranha é como bocejar com muito gosto em frente ao Maestro. Nada mais me convence. Apenas o estranho desejo de beber mais e mais a cada dia agonizante.

Sou fraca, principalmente no que escrevo. Repetitiva, como nos personagens que interpreto ou nos falsos amores que vivo. Vivo ou invento? Penso que de noite fujo da ressaca que me imponho por distração. E corro para escovar os dentes.

Admito: estou viciada em internet. É uma espécie de diálogo com o impossível, com o inacreditável, com um amor que é apenas meu que é tão belamente dolorido e tão facilmente vivido por quem tem a cabeça no infinito. Ou seja, eu.

Ando burra. Se começo a ler logo adormeço. Imposição do inconsciente que me faz travar o racional que tanto almejo. Acho que meu cérebro pede pausa por pura preguiça, assim como todo o meu corpo que pede sexo passivo.

Não sei porque insisto em dividir quando a ordem do dia é negar. Me perco na entrega, não jogo, não delimito justamente nos momentos onde deveria me afastar. Truco! Blefo onde não há mesa e no meu quarto ganho todas de todos. Sozinha mesmo.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

No som da web... Cam?


A modernidade é demais.

Te conheci num site.
Conversamos no msn.
Tecnologia de telefone móvel para delírios.
Volto para a net.
O facebok me dá outra dimensão do real, mais real mesmo. Necessária para os pés no chão da minha cidade.
Caio da cama e ligo a bateria do portátil.

Amanhã minha conexão religa e se esvai.
Almejo o oceano do tamanho de um lago, de centímetros, como você disse.

Sonho com o fim da energia elétrica.
Queria plantar cabos.

Viva a Vivo em Angola!

Adoro te ligar, te acordar e escutar um: beijinhos!!!!
O melhor é, depois do ato de sacanagem com Morfeu, receber um telefonema seu. Mesmo sem entender nada, me sinto alegre dirigindo sozinha pela noite da cidade que não quer telefonema nenhum.

O Jogo das Garras

Para João


Alvorada. Eu estava deitada quando o vi pela primeira vez. Não dei importância, nessa hora todos os gatos são pardos. Me lançou um longo olhar e partiu. Pra mim não é, pensei, estou deitada na Arvore da Criação e quem passa por mim sem parar não vale a pena. Rosnei, olhei para o horizonte e sorri. E ele sumiu.

Passaram-se semanas e me esqueci dele. Tantas paisagens, tantas ações cotidianas a serem cumpridas, não tinha tempo para delírios.

Acordei com uma pata em meu pescoço. Não tinha forças para gritar. Era o mesmo estranho. Diga quem és! Falamos juntos. E silenciamos juntos. Suas garras me metiam medo e me enlouqueciam. Vi que de fato o estranho não pertencia ao nosso grupo. Me alegrei por isso, todos ali me pareciam óbvios demais. Virei a cabeça e percebi um pequeno pássaro que nos observava ao longe. Estremeci por saber do auguro do pássaro. Tinha que manter a força, respondi apenas com vogais: Aaaaaaaooooooooooooo... Ele não retrocedeu. Aaaaaaaaoooooaaaaaa.... Ele me olhou nos olhos e tirou apenas a pata esquerda de cima de mim. A direita levou até o meu ombro direito, já trêmulo, confuso de tanta hesitação. Nunca tinha me deparado com um ser assim, distinto no espelho e íntimo na distância. Agora estou perdida. Sem pressa ele se pôs no chão e me disse, baixinho – Estamos tramados. – Perdeu-se na savana.

Perdi-me. Horas e horas sem um movimento, sem um pensamento além da tal trama. Que enredo seria esse?

Eu e minha Arvore da Criação. Sua sombra e sua determinação sobre o meu ciclo. Eu e meu lugarejo. Eu e minhas horas de tédio e de pavor, ociosa no horror do eterno esperar algum sinal de vida. Da minha vida ou da vida dele. Pelo menos de um pedaço da sua garra. Um filete de sangue meu, almejando cair na beira do abismo.

Nova alvorada, todos os dias.
- Te proponho um jogo.
- Jogo?
- Sim, temos os dois as armas.
- Não tenho arma alguma, não levo nada.
- Tens o necessário.
- Não tenho força.
- Garra.
- Como?
- Tens garra. É isso que me importa. Nosso jogo será um jogo de garras.

Espantei-me como nunca. Um jogo de garras? Eu que passei a vida inteira sendo reprimida por possuir as tais garras deveria agora mostrá-las? Como? Acho que não saberia mais olhar para as minhas patas.

- O que foi? Tens medo?
- Sim, muito medo. Uma vez cacei um pequeno gambá. Não oferecia perigo algum e por isso virei meu rosto. Fechei os olhos e pensei numa água, bem fresca. Acordei com essa marca que me arrancou o pêlo do lombo. Matei-o mas não o comi.

Era o que eu queria fazer com ele. Mata-lo, mas não me apetecia por a mesa para jantar. Nunca nenhum macho me pôs naquela condição. Sou forte e...

- Corre pequena, corre. Quero te ver fugir. Quando você pensar que chegou no final estarei lá, rindo da sua pressa.

Mas eu não sorri para ele. Tinha um tom severo e ríspido. Não estava para brincadeiras, era o necessário para o momento. Ele, ao contrário, parecia um filhote.

- Vou te contar um segredo. A vida não é nada difícil A vida é apenas... Interessante.

E olho para a minha arvore, a que eu acreditava ter sido a primeira do mundo.

- Você leva as coisas à serio demais. Foi criada no circo, no picadeiro. Eu conquistei a África, não necessito de platéias.

Como ele sabia disso?

- Tire suas luvas, não és gata. Ilumita-te com seu primitivo e devore, sem pensar.

Pela primeira vez comi um leão. E tive tanto prazer que tenho medo de matar todos ao meu redor.

Entardecer. Meu espelho fugiu-me das mãos. Não posso reter mais nadas, minhas garras estão imensas, incontroláveis. Era o jogo da eternidade.